segunda-feira, 16 de maio de 2011

Vida na noite

   Hoje recebi um convite para falar da vida na noite, na madrugada.
   Engraçado. Depois desse convite, fui provocado e comecei a lembrar de algumas histórias que passei ao longo desses quase 10 anos de trabalho a noite.
   Já fui assaltado. Tudo bem que na ocasião, apesar de estar com o táxi e de ser a noite, não estava trabalhando. Mas foi a noite.
   Uma vez ouvi de uma menina da noite que o nosso trabalho, o de taxista é bem parecido com o delas, pois temos que prestar serviços para desconhecidos, muitas vezes para pessoas desagradáveis e clientes que não podemos escolher, pois estão nos pagando por um serviço e temos que fazê-lo sem reclamar. Filosofias da madrugada!
   Na verdade esse conceito se aplica a quase todas os profissionais, mas durante a madrugada, esse tipo de filosofia tem um peso muito maior.
   Muitos são os causos, por assim dizer, que acontecem durante a noite dentro de um táxi. Posso dizer que já vi de tudo que um ser humano possa ver em uma vida. Aliás acho que esse é o bônus de quem trabalha a noite. Aliás, trabalhar a noite exige também algumas peculiaridades. Cito personalidade, não te preconceitos, jogo de cintura,  educação e paciência, muita paciência.
   Não desisti do meu sonho que é a carreira jurídica, afinal estudei bastante para isso, mas confesso aqui que gosto de trabalhar a noite. Acho que a noite por si, a liberdade que esse trabalho trás, me seduz. Conhecer as pessoas e sua diversidade na sua forma mais desarmada, mais desavergonhada, sem as máscaras e as carrancas dos seus uniformes e obrigações de trabalho os quais a maioria estão investidos durante o dia, é muito legal. O mesmo cara que tu vê de terno e gravata durante o dia, comandando com muita competência uma equipe especialista em finanças, a noite, chama um táxi, de preferência com os vidros escurecidos e pede para entrar na garagem da sua residência para pegá-lo, vestido de mulher, para levá-lo a uma casa GLBT.
   Isso é muito legal. Conversar com as pessoas, afinal durante a noite elas estão mais dispostas a conversa, pois estão usando o táxi a passeio, na maioria sem pressa, indo para uma festa ou evento, pedindo opinião a respeito da roupa, na maioria mulheres, perguntando de restaurantes, casas noturnas e até mesmo querendo escutar histórias vivenciadas durante a noite dentro do táxi.
   Claro que não são só de coisas boas que vive o táxi a noite. Além do assalto referido no começo desse texto, existem também os acidentes, as perdas, que nesses quase 10 anos não foram tão poucas assim em função da violência. Companheiros, camaradas que dividiam e ao mesmo tempo disputavam passageiros a noite foram mortos pela violência normal e inaceitável de uma capital. Assaltos, facadas, tiros e até acidentes de trânsito, foram responsáveis pelas mortes desses. Alguns próximos, outros um pouco mais distantes, mas ao mesmo tempo próximos pelo fato de serem colegas de profissão. Isso assusta, entristece e ao mesmo tempo faz com que reivindiquemos melhores condições, principalmente no que se refere a segurança pública e porque não, condições de trabalho e faz também que sejamos mais atentos aos perigos da noite.
   Em suma, trabalhar a noite é interessante, mas perigoso.
   Peço de antemão desculpas por esse texto, caso não seja interessante para muitos, mas é que o convite que recebi do meu "companheiro" de twitter e produtor da rádio Gaúcha de Porto Alegre, me fez pensar um pouco nessas coisas e colocar aqui nesse espaço.
   Queria dizer também, que esse monólogo foi escrito sob a euforia de um colorado comemorando o campeonato Gaúcho de 2011 e regado a um bom Cabernet Sauvingnon chileno.

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